Vieiros

Vieiros de meu Perfil


LUGAR DOS ROMANZINHOS

A glória do Pórtico

10:14 14/03/2010

Por decisão do rei Fernando I e concebido polo Mestre Mateo, o Pórtico da Glória foi construido na segunda metade do século XII. A exposição que se lhe dedica numa das luminosas salas do recém inaugurado Centro Social de Caixanova em Santiago contribui a revelar a transcendência de uma obra situada entre as mais salientes da arte románica e da universal. Melhores as imagens que os textos que pretendem desvelar o significado do Pórtico, as reproduções fotográficas apresentadas mereceriam constituir-se como um dos fundamentos de uma exposição permanente na cidade.

Dentro da exposição, num mapa do Caminho de Santiago reflete-se a aranheira de vieiros que unificaram a Europa em direção a Galiza, como uma frondosa árvore que abrangia as Ilhas Britânicas, Escandinávia, Rússia, Roménia, Croácia, Itália, Alemanha, Franza, Ocitánia, Catalunha, Navarra, Portugal, convergendo no tronco e raiz de Compostela. Só aparece algum caminho solitário que tivera a origem no resto da Península, no território de Al Andalus. Vindo desde Moscovo à Fisterra, a Terra de Santiago era a Galiza, o Reino cristão do cuadrante noroeste peninsular que conviveu durante quatro séculos com Spania, como era conhecida a parte islamizada. “Através do Caminho de Santiago Galiza esteve presente ns origens da identidade européia. O Caminho uniu Europa em direção a Compostela quando a extensa terra da Gallaecia constituia o limite cristão peninsular a respeito de Al Andalus. George Steiner celebra à relação fecunda entre a humanidade européia e a paisagem moldada e humanizada polos pés e as mãos e põe o percurso dos peregrinos para Santiago como paradigma das distâncias a escala humana, dos horizontes enxergados caminhando”.

O rei que construiu o Pórtico era filho do emperador Afonso VII e da emperatriz Berenguela. O pai fora coroado na catedral de Santiago como rei da Galiza. Os restos da nai, como os de el mesmo, os do seu filho e os de um neto galego de nai portuguesa que morreu de jovem antes de poder ser rei, jazem na Capela Real compostelana. Era bisneto de Afonso VI, o que começou a construção da catedral románica sobre a base da de São Pedro de Mezonzo. Este rei, que tomara o reino de Toledo, perdendo ao seu herdeiro de nai musulmana, na batalha de Uclés, lamentou a desgraça em galego, como se transcreve na crónica fazendo uma excepção num texto escrito em latim: “Ay meu fillo !ay meu fillo! ¡Alegria do meu coraçon e lume dos meus ollos, solaz de mia velleze! ¡Ay meu espello, en que me soía ver, e con que tomaba gran prazer! ¡Ay meu herdeiro mor! Cavaleiros, u me lo leixastes? ¡Dade-me meu fillo, Condes!”. Este sobresaliente rei foi desprezado por autores como Menéndez Pidal desde uma ideologia castelanista baseada na pretendida figura alternativa de um tão fantasioso como insignificante Cide. Tataraneto da rainha e emperatriz galega Sancha, criada na Piadela de Betanzos, o rei Fernando era o pai do Afonso VIII (dito IX) que já em 1188 reuniu uma Assembleia com a participação das classes populares e em 1218 fundou a Universidade de Salamanca, a primeira na Península, com professores galegos formados em Paris e Bolonha e com o arcebispo de Santiago como reitor assumindo numa nomeação que se manteria no resto da Idade Média. Salamanca, como Zamora, Badajoz, Lisboa ou Évora pertenciam à metrópole compostelana. Genro de Afonso Henriques, o primeiro rei do Portugal arredado do cerne galego, fundou as Ordens de Santiago e de Alcántara levando a expansão do seu reino até o Sul, de onde se tira o porqué de Salamanca ou Cáceres guardarem tanta obra galaica.

Foi no reinado de Fernando I (chamado II desde a ideologia de Espanha como nação única) e do seu filho Afonso VIII -enfrentados ao Papa aliado ao arcebispado de Toledo e ao recém estabelecido Reino de Castela- quando principiou o tempo político dos trovadores: desde a hegemonia de Compostela o galego era a língua romance de cultura, tanto em Coimbra ou Lisboa como em Toledo ou Sevilha. Avô de Afonso o Sábio, o romance de Fernando e da dinastía galega explica a língua utilizada para as Cantigas de Santa Maria.

Fernando era rei de Gallaecia. O Reino incluia a terra de além da montanha, como ocorrera desde o século V. Porém nos paineis da Exposição é apresentado como rei de Leão, tomando o nome de uma cidade –“civitate vocatur Legione, in Gallaecia”: “a cidade chamada Leão, na Galiza”, devo lembrar isto mais uma vez- que sendo uma residência da Corte desde que foi tratada assim por Ordonho II quando reinava desde Santiago, não pode ocultar nem o carácter central da cidade compostelana, nem a realidade do Reino da Galiza, uma palavra esta ausente da Exposição.

Mágoa. O Reino da Galiza é de novo negado numa ocasião tão especial como a do ano jacobeo e a de uma mostra tão singular como a que protagoniza o Pórtico da Glória. Não carece isto de importância em sí mesmo e no que revela, pois a consciência da personalidade histórica se corresponde com a capacidade para assumir as aspirações políticas, institucionais, económicas e linguísticas próprias deste tempo. Também as financeiras.

4,54/5 (35 votos)


Sen comentarios

Novo comentario

É preciso que te rexistres para poder participar en Vieiros. Desde a páxina de entrada podes crear o teu Vieiros.

Se xa tes o teu nome en Vieiros, podes acceder dende aquí:



Camilo Nogueira (foto pequena)

Camilo Nogueira

Camilo Nogueira Román naceu en Lavadores (Vigo) en 1936. Enxeñeiro industrial e economista, foi eurodeputado polo BNG entre os anos 1999 e 2004.



Máis opinións